1. A igreja
O mosteiro de
Refojos, dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, foi o mais importante
que existiu no concelho de Ponte de Lima e um dos mais importantes do
Alto Minho.
A
sua primitiva igreja estaria concluída em meados do século XII e terá
sido sagrada em 10 de Novembro de 1154, numa cerimónia a que presidiu o
legado pontifício Cardeal Jacinto.
Mais
tarde, o convento e a igreja iriam sofrer profundas e benéficas
alterações na sequência do movimento de reforma consagrado no Concílio
de Trento. No próprio ano em que
termina o Concílio deram-se os primeiros passos no sentido da
incorporação do mosteiro numa congregação de casas da mesma ordem, tendo
à cabeça o mosteiro de Santa Cruz de Coimbra.
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Com efeito
em 26 de Julho de 1564, D. Julião de Alva, bispo de Miranda e
Comendatário de Refojos assinava um rescrito que dava todo o poder ao
Prior de Santa Cruz para iniciar a reforma do convento de Refojos,
enquanto não chegasse a autorização papal para incorporar o dito
mosteiro no de Coimbra[1]. Embora o Geral da Congregação de Santa Cruz tomasse posse do mosteiro em 12 de Agosto de 1567[2], a bula papal concedendo tal autorização seria expedida de Roma apenas dali a alguns anos, precisamente a 23 de Junho de 1572[3].
O crescimento resultante da reforma exigia a remodelação e a ampliação da igreja e do edifício do convento.
Verdade é que a nova imagem da ordem aos olhos do público não só
aumentou o número das vocações monásticas como também moveu os corações e
as vontades para que afluíssem ao mosteiro os necessários recursos
económicas, segundo leva a crer o volume crescente de doações e
testamentos e o multiplicar-se, no arquivo, de papéis relativos a actos
de administração económica. Entre esses papéis não se contam hoje os
relativos às importantes obras levadas a cabo na segunda metade do
século XVI. No entanto possuímos elementos suficientes para a sua
datação. Num dos contrafortes da capela-mor, do lado norte, o canteiro
gravou a data: 1581. Na arquitrave que corre sobre a colunata do
claustro, do lado norte, a mais próxima da Igreja, foi lavrada uma
inscrição em belas capitais, que diz:
ERA MCLXX AEDIFICATA EST ECCLESIA PRIMA
ET ANNO DOMINI 1581 REAEDIFICATA
Sobre o modo como deve ser corrigido a primeira parte desta inscrição, noutro lugar me pronuncio[4].
A igreja, segundo a
inscrição, “foi reconstruída no ano do Senhor de 1581”. Deve ter sido
sagrada pelo Arcebispo de Braga, D. João Afonso de Meneses, no ano de
1582[5]. É um dos templos mais amplos de todo o Alto Minho e alberga no seu interior excelentes obras de arte.
É um pouco insólita a fachada principal do templo, mas a estranheza não lhe vem do equilibrado pórtico construído por volta de 1581, com motivos da gramática renascentista – arco
redondo simples enquadrado num rectângulo limitado lateralmente por
colunas compósitas sobre as quais se apoia um entablamento com friso
decorado, tendo os ângulos, entre as colunas e o friso, preenchidos por
dois medalhões com cabeças humanas – mas de uma transformação da
segunda metade do século XVIII, anterior a 1770, pois já se vê no
desenho que representa o convento e a quinta à sua volta, incluído no
livro do inventário nessa data elaborado[6].
A
parte superior da fachada foi transformada na segunda metade do século
XVIII, mas já estava assim em 1770, como se pode ver pelo desenho que
representa o convento e a quinta à sua volta, incluído no livro do
inventário nessa data elaborado. Foi rasgada uma ampla janela, com
dintel curvo, sobrepujada por um falso frontão de linhas côncavas,
rodeada por duas palmetas oblongas e divergentes, em simetria, e com um
pequeno ornato e fitas planas dobradas e recurvas ligando ao pórtico
infrastante. O remate é constituído por uma original solução
arquitectónica, tecnicamente arrojada mas esteticamente pouco feliz: as
empenas prolongam-se em duas badanas curvas salientes, que rodeiam uma
espécie de mísula central onde assenta a cruz cimeira: dá a impressão de
que este conjunto foi concebido como se inserido num grande semicírculo
recortado por quatro lóbulos em vazio, deixando assim projectadas no
espaço aquelas monstruosas aletas.
A torre sineira,
parcialmente derrubada por um raio, segundo há memória, foi reconstruída
em 1859, data que exibe numa cartela, a meia altura, com pequenas
modificações posteriores, como a aplicação do relógio e o
acrescentamento à cobertura de um remate bolboso de quatro arestas.
No seu conjunto, a
vasta igreja divide-se em dois grandes corpos: a capela-mor e a nave,
em cujas paredes laterais se abrem duas capelas de cada lado, do mesmo
modo que uma outra, de dimensões mais reduzidas, no extremo poente da
parede setentrional.
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A capela-mor, de
grande profundidade, correspondia às exigências litúrgicas da comunidade
regular, e foi coberta por uma abóbada de berço, em granito, em
caixotões, cujas molduras fazem lembrar obras idênticas construídas por
artistas da região, na mesma época, no Alto e Baixo Minho, tal como já
sucedia com o pórtico da entrada[7].
O retábulo da
capela-mor é, no seu género, uma das mais felizes obras da arte de
meados do século XVIl na região nortenha, se não em todo o país.
Reparte-se em três andares, cada um dividido em três partes por colunas
maneiristas que seguem o mesmo ritmo desde a base até ao remate. No
primeiro andar abre-se o espaço entre colunas, e sob um frontão curvo,
para dar lugar à tribuna destinada às exposições eucarísticas. De ambos
os lados, em nichos abrigados entre colunas, estão duas esculturas em
madeira estofada, de bom estilo, como todas as do conjunto,
representando os apóstolos S. Pedro e S. Paulo. No segundo andar,
preside, ao centro, uma bela e artística imagem da padroeira do convento
e da freguesia, Santa Maria de Refojos, cuja festa se realiza em 15 de
Agosto; em cada um dos nichos que a rodeiam, nos compartimentos
laterais, assentam as figuras imponentes dos dois santos fundadores e
patronos, Santo Agostinho e S. Teotónio. O último andar é ocupado, ao
centro, por um conjunto escultórico, que representa a Santíssima
Trindade, sob um frontão curvo; as alas laterais são preenchidas com
remates ornamentais: molduras, pirâmides, volutas...
Dois vitrais
recentes, mas de concepção tradicional, deixam entrar a discreta luz
que ilumina esta ábside. O arco cruzeiro apoia-se em pilastras dóricas e
insere-se num conjunto formado por um frontão de linhas rectas sobre
pilastras jónicas. A ampla nave está coberta por um tecto de madeira
compartimentado em caixotões por molduras de perfil simples.
As quatro capelas
laterais, duas de cada lado, são também cobertas por abóbadas de berço,
em granito, em caixotões idênticos aos da capela-mor, que abrigam
retábulos de talha barroca, do “estilo nacional”, das primeiras décadas
do século XVIII: colunas torsas, recobertas de pâmpanos, cachos de uva,
meninos e pombas, sobrepujadas por arquivoltas de pleno cintro com
idêntico ornato, “silvas” ou composições simétricas de “folhas de
acanto”, nas predelas, plintos e espelhos intermédios, com uma excepção:
a tribuna, já rocaille, do retábulo actualmente dedicado ao Sagrado Coração de Jesus.
Da
época de D. João V são os púlpitos inseridos, de ambos os lados da
nave, entre cada par destas capelas. Os ângulos entre o cruzeiro e a
nave foram também preenchidos com retábulos que os dosseis e certos
ornatos vegetais, executados em talha de tendência mais plana,
caracterizam como do estilo “joanino”, ou seja da segunda metade do
reinado de D. João V; da mesma época são as sanefas colocadas por cima
dos arcos de abertura para as várias capelas. As urnas dos altares essas
são de modesta feitura neoclássica,
Pelos
vários retábulos estão distribuídas esculturas em madeira estofada e
dourada, em geral de boa qualidade artística e do século XVIII. Destaque
especial talvez mereça a capela de Santo António, com uma bela
escultura do santo vestido de Cónego Regrante e dois painéis laterais,
da autoria de um artista provinciano das primeiras décadas do século
XVIII, representando episódios da vida do santo português: Santo António livrando o pai da forca, e Milagre Eucarístico em resposta ao desafio do hereje.
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E não
esqueçamos que à entrada, à esquerda, se abre na parede uma outra capela
de mais reduzidas dimensões, com um retábulo harmonioso, ainda que de
linhas sóbrias, de fins do século XVII, com um interessante painel
figurando o Purgatório a ocupar a parte central, e no ático outro painel
representando a Coroação da Virgem, tudo da mesma época.
No ângulo entre a
entrada e esta capela, por cima da pia baptismal, um quadro do século
XVII, expressamente indicado para o local, evoca o Baptismo de Cristo.
Na parede da nave, do lado oposto, outro quadro tem por tema a Ceia de
Emaús.
O
coro alto assenta num arco abatido de longo diâmetro, estando mobilado
com um cadeiral do início de oitocentos, cuja decoração mistura motivos
neoclássicos como outros da época anterior, tendo os espaldares com
pinturas da mesma época que representam os santos da ordem.
As obras da
sacristia datam do início do século XVIII: a data de 1711 está gravada
no arco de granito que separa o espaço mais próximo do templo,
enriquecido de uma bela fonte setecentista, do grande salão da sacristia
propriamente dita. Aliás uma interessante portada de granito aberta no
ângulo es-nordeste do claustro, e que dava para estes lados, tem
gravada a mesma data: 1711. Está a sacristia coberta por um belo tecto
de talha, também das primeiras décadas do século XVIII. Tanto o grande
armário dos paramentos como o outro mais pequeno embutido na parede
estão adornados com belos trabalhos de metal . Neste momento enriquecem a
sacristia duas pinturas em vidro (S. Joaquim e Santa Ana com a Virgem),
um quadro figurando a Santíssima Virgem, outro, muito ingénuo, de Santo
Agostinho, uma escultura de Santo António como cónego regrante, de
inícios do século XVIII, e quatro bustos (relicários?) de madeira,
também do século XVIII.
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Anote-se
que, na sua maior parte, as esculturas em madeira que encontramos na
igreja e sacristia estão já registadas no Inventário dos Bens do Mosteiro de Refojos do Lima,
elaborado em 1770, quando, na sequência do Breve Quanto Hora, do Papa
Clemente XIV, expedido em 4/7/1770, a pedido do Rei de Portugal, os
monges de Refojos foram transferidos para o Convento de Mafra[8].
2. O CONVENTO (de 1580 a 1810)
À reedificação da
Igreja, datada, como vimos, de 1581, juntar-se-ia a reconstrução do
convento. A essa época remonta o núcleo central do edifício actualmente
existente, que se dispõe à volta do claustro, tendo possivelmente as
obras continuado no início do século XVII e recebido acréscimos
posteriores.
O claustro é
nitidamente obra de finais do século XVI e presumivelmente da década de
1580, com uma austera mas bem proporcionada colunata que nos lembra
outro claustro da mesma época e, por sinal, de uma comunidade da mesma
observância: o do convento de Grijó, de 1574, que, embora de ordem
arquitectónica diferente (a de Refojos é toscana e a de Grijó é jónica),
até adoptou uma solução idêntica nos quatro ângulos, com colunas
adossadas a estreitos tramos de parede, quase à maneira de pilares, que
se fundem um no outro, a fazer esquina. Em Refojos a fórmula adoptada
para o andar superior foi mais simples e económica, mas resultou mais
harmoniosa e equilibrada: simples janelas que se abrem na parede, em vez
da galeria aberta com colunatas, mas de peitoris excessivamente altos,
de Grijó.
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Ângulo do claustro do mosteiro de Refojos
À falta de
documentos, não conseguimos saber o nome do artista a quem se devem
estas obras, mas o estilo faz-nos pensar em outras realizações
disseminadas pela região na segunda metade do século XVI: Viana do
Castelo, Guimarães, Amarante e mesmo Santiago de Compostela. Se a
abóbada da capela-mor lembra, por exemplo, as das capelas de S. Gonçalo
de Amarante ou de S. Martin Pinario, de Compostela, a colunata do
claustro encontra afinidade na de S. Francisco de Guimarães, já que a
abóbada da capela-mor lembra, por exemplo, as das capelas das igrejas
de S. Gonçalo de Amarante ou de S. Martin Pinario, de Compostela, e para
o portal se descobre paralelo em muitas obras nortenhas[9].
O facto de até ao momento não se encontrar qualquer obra datada que
preencha uma lacuna de quatro anos na respectiva biografia e as já
mencionadas afinidades com obras suas ou de parentes seus nesta região e
na Galiza (Mateus e Gonçalo Lopes e João Lopes de Amorim) faz-me pensar
num importante artista da nossa região, João Lopes-o-Moço, um pouco
relegado para segundo plano entre os seus familiares, pelos estudiosos,
devido a um imperfeito conhecimento da sua obra. Mas não se confunda com
ele outro artista, um século posterior, se bem que o apelido sugira a
sua pertença à mesma família, o qual datou e assinou a parte superior do
chafariz existente a meio do claustro:
FECIT IOSEPH LOPES 1683
Pela
diferença de estilo, sou tentado a dizer que se lhe deverá apenas o
remate superior desta fonte; mas a taça e o fuste subjacente são
trabalho tão incaracterístico e popular que é difícil garantir-lhe uma
data precisa, dizendo-o de época anterior.
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Fonte no meio do claustro
Analisando o trecho
inferior dos vários alçados, somos levados a pensar que, no essencial, a
planta do mosteiro ainda existente remonta ao período inicial e é
portanto anterior aos fins do século XVII, embora o edifício continuasse
a beneficiar de acréscimos sobretudo em altura.
De qualquer modo,
era já essa a planta em 1770, na data em que, segundo já referimos, os
frades tiveram de se transferir para Mafra, em consequência do plano
regalista do Marquês de Pombal. Houve então o cuidado de fazer um
inventário minucioso de todos os bens do mosteiro, indo-se ao ponto de
executar uma planta da quinta à sua volta, dentro da qual se insere o
convento, representando-o em alçado, visto do lado poente[10].
A igreja e o núcleo
central do mosteiro situam-se em plano mais recuado, no qual se abre a
principal porta de entrada. Dum outro corpo, que surge em plano mais
avançado, mas se adivinha ligado ao primeiro pelo prolongamento da ala a
sul do claustro, emerge uma parte central, mais alta e dividindo este
corpo com alguma assimetria; tem mais um piso, portas ao meio das
janelas do segundo e terceiro andar, talvez com sacada a dar sobre a
coelheira e o horto.
Vale
também a pena determo-nos um pouco a analisar o modo como, respeitando e
aproveitando as suas condições e aptidões naturais (relevo, água,
exposição solar), os monges organizaram o espaço da quinta. A par do
terreiro que se estendia na frente da igreja, com o seu cruzeiro
implantado no extremo poente, situavam-se, diante da fachada principal
do mosteiro, a coelheira e aviário, e as hortas e jardins, divididas em
rectângulos, dentro da tradição dos hortos à italiana; do lado norte,
por trás do celeiro e adegas (as casas a norte do adro), ficava o
castanhal, delimitado pelo aqueduto que conduzia a água ao mosteiro. No
rectângulo a sudeste do convento frutificava o pomar. O resto da
propriedade dividia-se em duas metades: uma do lado norte, entremeado de
olivais e terras de lavradio, com a parte mais funda a poente apenas
em campos de lavradio, bordejados no extremo do seu conjunto por uma
fila de árvores; a metade sul estava na sua maioria ocupada pela vinha,
com excepção, em contrapartida, da parte mais baixa, a sudoeste, também
repartida por campos de lavradio, contíguos uns aos outros, no seu todo
igualmente rodeados por uma fila de árvores. No meio das vinhas
situava-se o lagar e, a sudoeste, o pombal.
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* * *
Após a morte de D.
José concluir-se-ia o infeliz período da estadia de Cónegos Regrantes em
Mafra. Devido ao projecto regalista do Marquês de Pombal, os religiosos
menores de S. Francisco da chamada observância de S. Pedro de
Alcântara, a quem D. João V havia concedido o convento, tinham sido
distribuídos por outras casas da mesma ordem; em Mafra concentraram-se
os Cónegos Regrantes de nove mosteiros que se fez suprimir, incluindo o
de S. Vicente de Fora, para onde o Rei desejava transferir a Igreja
Patriarcal de Lisboa, em breve espaço de anos três vezes destruída por
incêndios, e o de Refojos do Lima[11].
D. Maria,
neste como em muitos outros casos, decidiu repor, na medida do possível,
o anterior estado de coisas, por decreto de 11 de Abril de 1780,
fazendo regressar os Religiosos Menores a Mafra e restituindo aos
Cónegos Regrantes a posse dos seus mosteiros, embora nem todos eles
tenham sido reactivados. Na parte que diz respeito a Refojos, a
determinação da Rainha foi concretizada na provisão de 29 de Maio e no
alvará de 3 de Junho de 1780, que ordenava a restituição à congregação
dos Cónegos Regrantes do Mosteiro de Refojos do Lima, de que se havia
feito venda ao mestre de campo Pedro Malheiro Pereira Marinho, mandando
pagar-lhe “doze contos, quinhentos e vinte mil reis, em satisfação do
preço que deu e das despesas que tem feito”, com o objectivo de que o
“dito Mosteiro seja outra vez povoado pelos ditos religiosos, na forma
que ao Dom Prior Geral e seus colegas for possível, pertencendo-lhe
todas as rendas, graças, privilégios e isentos que tivesse ao tempo da
sua união ao Mosteiro de Mafra, que ficaria também abolida, como se
nunca fora feita”[12].
Foi já em Refojos que, em 26 de Agosto do mesmo ano, se lavrou o auto
de entrega, outorgando, de uma parte, o Dr. José António da Mota Gomes,
Corregedor da Comarca de Viana do Castelo, e da outra D. André da
Anunciação, Procurador Geral da Congregação dos Cónegos Regrantes de
Santo Agostinho[13].
Certo é que a reinstalação dos Regrantes em Refojos não foi imediata e,
além dos embargos postos pelo mestre de campo Pereira Marinho,
facilmente ultrapassados, outras dificuldades haveria a superar[14].
Só depois do Breve pontifício Expositum nobis,
expedido em 1792 por Pio VI, o Bispo D. José Maria de Mello poria em
andamento os trâmites conducentes à efectiva conclusão do processo. Os
religiosos de Mafra, assim como os bens respectivos, seriam distribuídos
apenas pelos mosteiros de S. Vicente de Fora e pelo de Grijó, e,
somente no caso de se verificar ser necessário, pelo de Refojos. Meio
ano depois, nova sentença de D. José Maria de Mello decidia em
definitivo a reactivação do convento de Refojos, anexando-lhe os bens e
rendimentos pertencentes ao de Cáramos (concelho de Felgueiras). A
partir de 30/12/1794 ficava estabelecido que a Congregação dos Cónegos
Regrantes se passava a compor dos Mosteiros Santa Cruz (de Coimbra), S.
Vicente de Fora (de Lisboa), S. Salvador de Grijó, S. Agostinho da Serra
(do Pilar) e Santa Maria de Refojos, tendo os primeiros 80 e 60
cónegos, respectivamente, e os outros 30 cada, num total de 230, sem
contar os religiosos inválidos, desde que estes não ultrapassassem os
20, nem os conversos, que poderiam ir até aos 50, mais 10 inválidos[15].
É depois desta data
que se reanima o convento de Refojos. É natural que durante os anos de
abandono se tivessem degradado as instalações do mosteiro e mesmo que
fizesse falta proceder a uma séria de adaptações às novas
circunstâncias.
Em 1802 estão já em
curso trabalhos destinados a "concluir e acabar de reedificar a obra do
dito mosteiro mandada fazer por insinuação régia", conforme se exprime
um documento do ano seguinte[16].
O traçado das obras a efectuar, das quais se desconhece o risco e o programa escrito, foi confiado ao arquitecto José do Couto[17]. Do projecto constaria, por certo, a
reconstrução dos muros externos na fachada leste e a remodelação da
fachada poente, cuja conclusão – que apenas se verificou parcialmente –
iria criar uma outra imagem externa, muito mais imponente, do
mosteiro. Cresceu a ala sul desta fachada com o acréscimo de um andar e
a deslocação mais para norte do pano central, a cujo 1.º andar, a
portaria nova, se tinha acesso por solene escadaria. Não chegaram a ser
realizadas as obras que levariam à construção duma outra ala, a norte,
simétrica com a do lado meridional, o que, a verificar-se, iria dar ao
edifício outra majestade.
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Projecção do que seria a fachada poente do mosteiro se as obras ficassem completas
No Arquivo
do Convento de Refojos do Lima ainda hoje se encontra o livro, onde, mês
a mês, se foram registando as despesas com os trabalhos[18].
De 1802 a 1807 decorreram em ritmo crescente as obras, nas quais
trabalham diversos operários, destacando-se mestre André, na obra de
pedraria, e um João, mestre carpinteiro, mas não estão ausentes o
ferreiro, os pintores, os caiadores e os trabalhadores indiferenciados,
que se ocuparam designadamente na remoção da terra resultante dos
aterros. O maior volume dos trabalhos diria respeito à renovação dos
telhados e à remodelação dos interiores.
Gastou-se um
extraordinário número de telhas, de tijolos (na maioria, segundo creio,
para as abóbadas construídas em diversas dependências), e de madeira,
sobretudo de castanheiro (o pinho também é usado, mas para os andaimes).
A madeira de castanho foi adquirida, em considerável quantidade, na
vizinha freguesia da Miranda e no concelho de Ponte da Barca, ao ponto
de ser necessário requisitar oficialmente, para a transportar, os
carreteiros da região[19]. A pedra era quebrada na Passagem e transportada em barcaças, numa parte do percurso, através do rio Lima.
Nas obras
deste período incluiu-se uma capela, segundo penso, no interior do
convento, para serviço interno, tendo sido pago em Fevereiro de 1805 o
retábulo para a capela nova.
O ano de 1807 é
aquele em que mais intensamente se opera nas obras de Refojos,
parecendo que uma das fases está para se concluir, e ainda bem, pois se
aproximam anos conturbados, que tornarão difícil o prosseguimento e
levarão mesmo a interrompê-las, para depois as recomeçar, sem porém
levar a termo o programa inicial.
A obra mais
em destaque realizada neste ano foi a da colocação de azulejo em várias
dependências da parte nascente. Ao azulejo se dedica o capítulo
seguinte.
Pela mesma data em
que eram assentados os azulejos, o convento de Refojos pagava um painel
novo para o refeitório e o seu transporte desde Lisboa[20].
Trata-se do painel da última Ceia, que conhecemos através da
fotografia publicado por Mendes Norton, cujo paradeiro se ignora
(informaram-nos depois que tinha sido adquirido em Moreira de Lima pela
Fundação Ricardo Espírito Santo e entretanto viemos a saber que
posteriormente foi adquirido para a Igreja de Cedofeita, no Porto). Uma
olhadela superficial a este quadro bastará para mais uma vez sorrirmos
da ingenuidade daquele autor, que, enamorado do convento que era então
propriedade sua, em todos os quadros e azulejos via obras de Rafael
Sanzio de Urbino. Pode, no entanto, dizer-se que se trata de um quadro
de bom autor e não andaremos longe da verdade se o atribuirmos a Pedro
Alexandrino ou a algum dos seus discípulos.
3. OS AZULEJOS
Em Junho de
1807, o mosteiro de Refojos pagava perto de 13.000 azulejos adquiridos
em Lisboa, fazendo-os conduzir em iate até ao porto de Viana, de onde
seguiriam para Refojos[21]. Em Outubro, liquidavam-se mais despesas havidas com os mesmos[22] e no mês de Novembro pagava-se o trabalho ao respectivo assentador[23].
Como observação curiosa, registe-se o facto de ter sido paga em
separado a pintura com que, na fábrica, em Lisboa, foram ornados os
referidos azulejos, despesa que ultrapassou os 50% do seu custo na
origem[24].
Embora não
conhecesse então o documento em que agora me baseio, já em 1984, num
breve artigo sobre os azulejos de uma casa dos arredores de Arcos de
Valdevez, trazidos de Lisboa há poucas décadas, de um edifício aí
demolido na rua da Conceição, apontei a sua afinidade com os de Refojos,
considerando-os, por conseguinte, vindos de uma fábrica da capital[25].
Infelizmente uma grande parte destes já se dispersou e, só através das
fotogravuras da delirante obra de Thomaz Mendes Norton conseguimos ter
uma panorâmica do extraordinário conjunto por eles formado[26].
É esse, aliás, o único valor de um livro, cujo autor sonhou com a vinda
a Refojos do Lima de Bramante e de Rafael para gizar e executar obras
que só foram pensadas muitas décadas após a sua morte, no caso da
arquitectura, ou quase três séculos depois, como aconteceu com os
azulejos e algumas das pinturas, e ainda por cima se afadigou em vão a
recolher elementos, erros e fantasias, para comprovar a sua mirabolante
tese.
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Azulejos da sala do capítulo
Dos quatro grupos de azulejos conservam-se no mosteiro, quase íntegros, os da cozinha, uma boa parte dos da dita sala do capítulo ou capela de S. Teotónio, a meio da ala nascente do claustro, e apenas alguns restos dos demais. Os panos de azulejos que ainda se conservam nas paredes da chamada sala do capítulo ou capela de S. Teotónio têm na parte inferior um rodapé com pintura rajada a sugerir mármore, enquanto a parte superior é constituída por painéis decorativos policromos, que utilizam motivos neoclássicos, cujo uso se difundiu em Portugal no reinado de D. Maria e continuou no de D. João VI, isto é, nas últimas décadas do século XVIII e princípios do século XIX .
O ciclo
barroco chegara à exaustão, e os artistas, tal como o público, estavam
cansados dos excessos irracionais a que o “rocaille” chegara e desejavam
não só a novidade, mas também uma arte mais simples e luminosa, de
acordo com a época em que devia predominar a razão, segundo os teóricos
do iluminismo. É nessa linha que se dá a revalorização da arte
clássica, teorizada por Winckelmann e Mengs, cujas raizes decorativas
remontam aos “grutescos” (grotteschi) do século XVI, incrementados após a
descoberta da “Domus Aurea” de Nero e de outras ruínas romanas e postos
em voga com a decoração das Loggie do Vaticano, sob a orientação
de Rafael, mas que hauriram novos motivos de inspiração nas obras
postas a descoberto com as escavações de Pompeia e Herculano.
Estamos aliás
no período áureo da faiança nacional, e o bom domínio das técnicas do
esmalte e do colorido contribui para a beleza deste azulejos. Nestes, da
Sala do Capítulo, o fundo é realizado em esmalte branco, animado por
uma ornamentação de grinaldas de flores e ramagens, de cores vivas e
harmoniosas, distribuídas com leveza, o que confere a estes painéis uma
grande luminosidade e transparência. Ao centro de cada painel há uma
elipse, com o eixo maior na vertical, e dentro dela, em azul, um monge
vestido com diversos hábitos dos cónegos regrantes, identificados numa
cartela rectangular na parte de baixo. Se bem que alguns já estejam
mutilados, neste ano da graça de 1987, existem na capela os painéis que
ostentavam as seguintes inscrições:
OS CONEG. R. DE S. VITOR
OS D.D. PRIOR. DA CONG. DE PORT. EM HAB. PERLAT.
OS CONEG. R. DA CONG. DE S. SALVADOR
OS CONEG. R. DA CONG. DE VALVERDE
OS CONEG. R. DA CONG. DE S. TIAGO
OS CONEG. R. DA CONG. DE S. COSME
OS CONEG. R. DA CATH. DE PANPEL.
Faltam os painéis que tinham as legendas relativas aos:
Dd. Priores da Congregação de Portugal em hábito de cor,
Cónegos regrantes com o seu hábito de cor,
Cónegos Regrantes de S. João de Latrão,
Cónegos Regrantes da Congregação do Espírito Santo, os quais estavam dispostos na parede do lado norte,
Cónegos Regrantes da Congregação de S. João Baptista, a meio da parede do lado sul.
Mantém-se a toda a volta o rodapé rajado de azul.
A escultura de
S. Teotónio foi substituída por uma outra, bem mais pequena, de S.
António, em granito, obra de modesto nível artístico.
De índole bem
diversa era o conjunto de azulejos que existia na sala que Mendes
Norton designo como “De profundis”, constituído por nove painéis
figurativos, oito deles com grupos humanos, historiando diversas fases
da vida do convento, e o outro com uma paisagem e uma árvore em primeiro
plano, destinado a encher um espaço mais estreito.
Os painéis
inseriam-se numa composição arquitectónica composta por um soco de que
sobressaiam os plintos sobre que se apoiavam pilastras jónicas
caneladas, a separar os vários quadros, cuja moldura tinha na parte
superior o recorte de um arco composto (semicírculo na parte superior,
segmento de recta, na horizontal, arco convexo de ambos os lados),
rodeado de ornatos vegetais pela parte de fora (ramos e grinaldas). Não
conhecendo o paradeiro destes painéis, é impossível pronunciarmo-nos
àcerca do seu colorido, mas, pela composição, pelo desenho e pelo
tratamento da figura humana e dos panejamentos, não restam dúvidas de
que se trata de um pintor muito vizinho do círculo de Pedro Alexandrino,
mas com alguns apontamentos que recordam Pillement. Não se esqueça que o
mosteiro pagou separadamente um pintor para a confecção destes azulejos
e o trabalho que lhe terá sido encomendado não deveria consistir
especificamente na execução de ornatos – para esses a fábrica disporia
de artesãos que os fariam como ocupação habitual – mas uma obra
diferente, que, mais do que a pintura dos pequenos quadros dos outros
conjuntos, incluindo os temas “de genere” da cozinha, seria em primeiro
lugar a pintura destes painéis, onde se compendiava a história do
mosteiro.
Um medalhão
circular, entre palmas e grinaldas, na parte inferior de cada um dos
painéis, identifica o episódio ali historiado. Nem todas estas
inscrições estão correctas, o que denuncia o baixo nível de
conhecimentos históricos, mesmo em relação ao próprio convento, por
parte dos nossos Cónegos Regrantes, ou ao menos por parte daquele que
foi encarregado de fornecer o programa ao pintor dos azulejos:
O cavalheiro
Afonso Ancemondo, dizendo ao Conde D. Henrique que reconhecimento das
victórias alcançados com elle doara a Igreja de Santa Maria e mosteiro
ao Prior e Cónegos de Refoyos.
Menendo Afonso
filho de Afonso Ancemondo, com sua mulher Dona Gontina, beijando a mão
ao Soberano pela doação do condado de Refoyos.
O conde Menendo
Afonso, e sua mulher, donna Gontina, fazendo doação do seu condado a seu
irmão Dom Pedro Prior de Refoyos, e mais cónegos.
Pelagio Bispo de
Tui, dando ao Prior, e mais cónegos, a izenção da igreja de Refoyos e
as mais que lhe fossem annexas, da jurisdição bíspal.
O Cardeal
Jacinto, legado romano, firmando pela sua autoridade a carta izenção,
que concedera Pelagio, bispo de Tuy, à igreja de Refoyos e sua anexas.
O Papa Alexandre
111 dando ao Prior e mais cónegos a bulia de izenção Refoyos,
assujeitando-o(?) somente à Sé Apostólica sem mais dependência de alguma
diocese.
O novo hospital
foi mandado fazer pelo segundo prior desta caza, chamado D. Gonçalo e
seos companheiros, respirando a caridade com que deviam ser tratados os
doentes e peregrinos.
O prior com seus
cónegos, mandando pelo beato Romeu, converso, receber todos os pobres
doentes e peregrinos, sobresahindo a caridade do dito converso com
desempenho desta virtude do christianismo.
(Todas estas inscrições se encontram em maiúsculas, com excepção dos q, idênticos aos dos alfabetos unciais).
.
Excepcional
conjunto formavam também os painéis de azulejo do refeitório, servindo
de espaldar às bancadas em que os monges tomavam assento, à volta da
sala, nas horas do repasto. No rodapé o centro é ocupado por uma rosácea
cercada de flores, e de ambos os lados mais uma vez se aplicou a cor a
provocar a sugestão do mármore. Os grandes espaldares estão inscritos
num arco composto como o do conjunto anterior, mas sem envolvências
arquitectónicas. No centro de cada painel emoldura-se uma paisagem,
cujo estilo denuncia as influências de Pillement; o resto é preenchido
com uma decoração luxuriante: ao alto um vaso cheio de flores, que se
apoia em ramagens ou palmas torcidas, do qual desce para cada lado uma
grinalda, enrolando-se à volta do peito de dois bustos infantis e da
haste vegetal sobre que se apoiam; de um mascarão, que suporta os
quadros das paisagens centrais, partem bandas e caules de ramagem que se
recurvam e terminam em flores. Sem deixar de ser bela, esta decoração é
mais pesada e erudita que a da capela de S. Teotónio, vendo-se
perfeitamente que o artista tinha presente o modelo oferecido por alguns
conjuntos de azulejos das últimas décadas do século XVI, podendo ser
classificados como dessa época por um observador menos atento, se não
fossem os rectângulos centrais com paisagens de maneira mais recente.
No
vão situado entre o refeitório e a cozinha, há trechos de azulejos,
rajados nos rodapés, com decorações florais estilizados, uns azuis e
outros policromados.
A
cozinha é um amplo salão, abobadado como o refeitório e várias outras
dependências, com duas colunas ao meio. É ampla a chaminé, e no seu
lugar está ainda a mesa de pedra, em frente.
A toda a volta, as paredes estão revestidas de azulejos, desde o chão
até aos arranques da abóbada. Na maior parte, estes azulejos são lisos,
tendo apenas uma cercadura azul a delimitar os vários panos do muro. Em
cada um destes panos, há no entanto grupos de azulejos com composições
figurativas adequadas a este ambiente e a animar a monotonia das
paredes: naturezas mortas de tema gastronómico, com variadas qualidades
de peixes, hortícolas, frutos, charcutaria... a denunciarem um artista
bom observador e cheio de verve.
.
4. De 1810 a 1834
As invasões
francesas fizeram abrandar o ritmo das obras no convento de Refojos, a
partir de 1807, mas desde Abril de 1811 cresceu de novo o ritmo dos
trabalhos. No entanto, em relação ao edifício do convento, os
documentos apenas referem expressamente a construção da varanda, em 1818
e 1819: aquisições de barcaças de pedra, com a menção expressa de se
destinarem aos arcos da varanda, pagamentos a pedreiros e lavrantes,
inclusivamente ao mestre Sebastião.
Meses
antes, em 30 de Abril, o Prior D. José da Expectação passava uma
procuração para a celebração de um contrato com o mestre João Alves, de
Gondoriz, Arcos de Valdevez, para, sob a direcção do mestre de obras do
mosteiro, derrubar um edifício velho, que ia ter ao adro da igreja, e
levantar nova construção, da qual “no S. Miguei será obrigado a ter já
prompta hũa p.te do Edifício para se recolherem os frutos”[27].
Apesar de toda esta urgência, parece-me que a obra – deveria tratar-se
da projectada ala norte da fachada poente, frente principal do edifício
– não chegou a ser feita, se é que o contrato foi assinado (com efeito,
não consegui encontrar a escritura nos livros dos tabeliães de Arcos de
Valdevez, onde a procuração supunha que se devia fazer o contrato).
E
interromperam-se assim, deixando-o incompleto, as obras do mosteiro,
visto que os anos posteriores, com a revolução liberal e a agitação que
se lhe seguiu, não seriam propícios à sua conclusão.
.
Área tradicionalmente conhecida como da abegoaria
Como
já observei, uma parte das despesas efectuadas com as obras, de 1811 a
1818, parece referir-se a melhoramentos efectuados na quinta, incluído o
transporte de esteios para as latadas, o que corresponde a uma
distribuição da vinha diversa da que existia em 1770.
Toda
a organização do espaço dentro da quinta passava, aliás, a obedecer a
outro esquema, ganhando o aspecto que, mais ou menos, ainda hoje
apresentada. Grandes espaços rectangulares, correspondentes a níveis
diferentes, são delimitados por muros de suporte e bordejados de
latadas. O caminho que sai da abegoaria, situada na parte sul do
convento, em direcção à casa da eira, depois de a contornar, ia ter a
uma pérgola circular apoiada numa colunata toscana, e daí descia até à
parte mais funda da quinta. Para norte e sul desta pérgola, por debaixo
da vinha, chegava-se a dois mirantes de planta quadrangular, nos
ângulos da área mais geometrizada da quinta. A superfície com maior
densidade de vinha continuou a ser a localizada a sudeste do convento,
assim como a sudoeste se estendiam os mais extensos campos de cultivo.
Era
assim, como fica descrito, o convento de Refojos, com a sua quinta,
quando em 1834 foi atingido pelo decreto de extinção das ordens
religiosas, elaborado e publicado, contra o veredicto do Conselho de
Estado, pelo liberal Joaquim António de Aguiar! Desde então, o
património deste, como o dos outros extintos conventos, passando da
Fazenda Nacional para as mãos dos particulares, foi-se degradando em
ritmo crescente, não obstante os esforços pontuais de um ou outro
proprietário, para suster a devastadora ferocidade do tempo que passa.
As obras implementadas, com o novo destino que foi dado ao edifício do
mosteiro e à sua quinta – a nova Escola Superior Agrária – contribuíram
para dar uma nova vida ao muito que ainda resta.
.
O edifício do mosteiro com o acréscimo, a nascente, da área destinada
a residência de estudantes e estufas para culturas agrícolas na quinta
[1] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, maço 180, doc. 92.
[2] A.N.T.T., Mosteiro de Refojos do Lima, códice 78: Livro do Tombo original do Mosteiro de Refojos do Lima feito por André Cabedo de Vasconcelos, 1591, fl. 127: Auto de posse do mosteiro de Refojos em 12/8/1567, pelo Geral da Congregação de Santa Cruz (treslado).
[3] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, maço 180, doc. 91.
[4]
A construção da primitiva igreja deve ser colocada entre os anos de
1143 (início) e 1152 (conclusão). Nesta inscrição deveria ler-se MCLXL
em vez de MCLXX. As origens do convento constituem objecto de outro dos
nossos estudos.
[5]
D. Nicolau de Santa Maria (não se esqueça a reserva com que este
cronista deve ser lido) informa-nos que se fez nesta data, na presença
do Arcebispo D. João Afonso de Menezes, a trasladação do corpo do Beato
Romeu da capela de S. João de Penas para a capela-mor da nova igreja,
onde ficou colocado na parede do lado norte, outro tanto sucedendo com
os ossos de um dos fundadores, Mendo Afonso, retirados do exterior das
paredes da velha igreja para a parede sul da capela-mor do novo templo,
onde ficaram assinalados pelo epitáfio, também ele com data errada, hoje
embutido nas paredes do claustro. Cf. Nicolau de Santa Maria, Chronica da Ordem dos Cónegos Regrantes do Patriarca S. Agostinho, Lisboa, 1668, pp. 309-310.
[6] A.N.T.T., Mosteiro de Refojos do Lima, códice 71: Inventário dos Bens do Mosteiro de Refojos do Lima, 1770, fl. 277.
[7] Veja-se, a seguir, a nota 9.
[8] A.N.T.T., Mosteiro de Refojos do Lima, códice 71: Inventário dos Bens do Mosteiro de Refojos do Lima, 1770, fl. 40 e 55.
[9] António Matos Reis, Lopes - Uma Família de Artistas em Portugal e na Galiza, em “Revista de Guimarães” 95 (1986). Separata, 1989,
[10] A.N.T.T., Mosteiro de Refojos do Lima, códice 71: Inventário dos Bens do Mosteiro de Refojos do Lima, 1770, citado. A planta ou mapa da quinta, com o convento em alçado, encontra-se a fls. 277.
[11] A.N.T.T., Mosteiro de Refojos do Lima, maço 10, doc. 91: Processo de restituição do mosteiro aos Cónegos Regrantes.
[12] Ibidem, ibidem.
[13] Ibidem, ibidem.
[14] Ibidem, ibidem.
[15] Ibidem, ibidem: Sentenças executórias do Breve Expositum nobis de Pio VI.
[16] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, maço 180, doc. 113. Os trabalhos devem ter começado em meados de 1801, encontrando-se as respectivas despesas registadas no Livro
da receita e despesa deste Real Mosteiro de Santa Maria de Refoyos do
Lima, que teve o seu princípio no primeiro de Julho de 1801, sendo o
prior o Rev. º D. Ildefonso de Nossa Senhora do Carmo e Procurador e
Camerário o Cónego D. Bento da Senhora das Dores. Este códice encontra-se no A. D. B., Mosteiro de Refojos do Lima, cota 42, sendo designado no respectivo inventário por Livro das Receitas e Despesas da Camararia. O termo de abertura é de 4 de Janeiro de 1802.
[17] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, CR 42: Livro das Receitas e Despesas da Camararia,
citado, fl. 44 v.º, onde, em Fevereiro de 1806, averba o seguinte: “Em
hum risco para as obras, e jornada do Arquitecto José do Couto no
principio do triénio passado, o que tudo ultimamente em cab.º se mandou
pagar - 69.340”. Em Maio do mesmo ano paga-se o “Seguro de hum risco que
foi para Lisboa - 1.110”.
[18] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, CR 42: Livro das Receitas e Despesas da Camararia, já citado.
[19] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, maço 180, doc. 113.
[20] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, CR 42: Livro das Receitas e Despesas da Camararia, citado, fl. 68: “Em hum Painel p.ª o Refeitório – 120.000 / Em hum caixão p.ª o d.º e mais despesas feitas em Lx.ª – 1.320”.
[21] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, CR 42: Livro das Receitas e Despesas da Camararia, citado, fl. 61: “Em a despesa de 12.932 azulejos, pertencente à fábrica, e ladrilhador – 315.736”.
[22] Ibidem, fl. 68: “Em o resto do azulejo, pintura, mais despesas com o dito feitas em Lx.ª – 275.214”
[23] Ibidem,
fl. 69: “Em o assento de 10.739 azulejos a 3.800 – 40.950 / Em 50 dias
que o assentador do azulejo trabalhou por conta da caza a 120 – 6000 /
Em a jornada do dito assentador e convite – 25.600”.
[24] Ibidem, fl. 61 v.º: “D.ª em a pintura dos azulejos – 380.640”
[25] António Matos Reis, Os Azulejos Neo-clássicos da Casa das Cortinhas, em “Terra de Val de Vez” 7 (1984), p. 59-62.
[26] Thomaz Mendes Norton, Études sur les Oeuvres d’Art de Raphael Sanzio D’Urbino au Monastère de Refojos do Lima, Lisboa, 1888. J. M. dos Santos Simões, Azulejaria em Portugal no século XVIII,
Lisboa, 1978, p. 90, em nota, refere que alguns desses painéis de
azulejos se encontram na casa do Dr. Lusitano Brites, de S. Pedro do
Estoril. Há alguns anos tive a oportunidade de ver alguns azulejos do
conjunto proveniente do refeitório, numa moradia do concelho de Ponte de
Lima (da família Norton, na freguesia de Queijada).
[27] A.D.B., Mosteiro de Refojos do Lima, maço 180, doc. 107 e 124.